Eu sempre fui o que foi de mim? Quanto mais velho, mais jovem. Quanto mais jovem, mais perdido fica. Maturidade… sem explicação bate à porta às quatro da madrugada e é só insônia, tédio e medo. No fim, é isso um pouco, com um pouco de gosto de algo alcoólico que se bebeu para chegar o sono, evitando o remédio fácil. Amanhã, recomeço. Mas o que? Recomeço o estar de novo no furacão, na vigília constante dos dias sem muito além, no dia de hoje com a certeza de paz diminuta, essa paz a duras conquistada. Pensa? Mas há a certeza do além, no quanto mais velho, mais jovem. A clareza do além. Há clareza nisso? No além? Mas o que há são perguntas e permutas. Permutas, sim, há muitas, todos os dias. No sorriso novo ganho na multidão, na música que se descobre, no que ainda se descobre de corpo, porque na mudança o perdemos um pouco, esquecemos.
Outro exercício do dia: o esquecer. Esquece-se de tudo, de propósito. Os nomes dos antigos nas fotos que não entendemos mais. No olhar na foto que não nos reconhecemos, na juventude. Na foto na cama, ao lado dela, ao despertar de há mais de dez anos, quando ainda despertávamos juntos, de mau humor diante do dia claro que se anunciava, numa cama de solteiro velha num quarto mofado. O dia, seus desafios tão menos caprichosos a cada ano que passa. A cada ano de dia, de vida perdida, de mesma coisa sem o despertar conjunto de há dez anos porque nem cama e nem quarto, nem ela ou coisa válida hoje existem, e sobrou o despertar do todo dia, o despertar somente, o desagradar-se de contentamento.
Quanto mais velho, mais jovem. Mas o corpo sente, a paciência acaba e a tolerância aumenta. Tolera-se a vida, cada vez menos inteligente. Cada vez menos, por mais que se busque, mas há os livros, ainda um refúgio possível. Livros, sem tomadas, sem eletricidade, que dependem de luz externa a eles para serem lidos, sem muito sol, por favor, para não danificar o papel. O toque no papel, seu cheiro. Livros e o eterno contato sensual que com eles temos, o valor táctil dos seus poros, seus suores noturnos. Livros. Quanto mais velhos, mais jovens. Livros: o único caminho possível.
O envelhecer é inevitável e nossa tentativa irrefreável sempre é para que esse envelhecer venha a trazer algo bom, proveitoso... Buscamos amadurecer, buscamos melhorar, buscamos mais saúde, mais tempo, e com isso envelhecer mais e mais... Envelhecer nos traz alegrias, conquistas, felicidades, sorrisos... Também nos traz tristezas, perdas, dores e lágrimas... Envelhecer é viver!
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