pra Vença
do princípio,
comecei preenchendo a linha do endereço de e-mail com o título da mensagem. Os títulos têm mexido à beça comigo ultimamente. Parei naqueles títulos do Graciliano, a capacidade de concisão em uma palavra - Angústia, Insônia. É difícil isso em português, esse mínimo.
Daí tenho vivido aqui nesse mínimo. De olhar as mínimas coisas do dia. Tem um beija-flor que fica sempre no mesmo lugar do estacionamento, um lugar estranhamente sem flores, estas sempre atrás dele, numa longa árvore. Vi umas bonitas crisálidas na casa de minha tia, crisálidas de onde sairão borboletas amarelas que viverão pouquíssimo pelo que me contou minha mãe. E as crisálidas lá, marrons, brilhantes. Disse-me mãe que elas se espalharam pela casa toda, dentro de porta-coisas, lugares escuros. A que vi estava na biblioteca, num tubo de papel cartão, desses que servem para guardar grandes mapas, projetos frios de engenharia, desenhos de alunos das artes, cheios de vontades de mais.
Tenho andado pela cidade das mínimas coisas. Das pessoas munidas de seus problemas diminutos - no ônibus, no tráfego - ou de seus problemas maiores - no avião, no tráfico. As pessoas sempre em seus cotidianos, como o grande cartaz amarelo que vi em uma loja do centro da cidade escrito em uma língua oriental - ideogramas chineses, japoneses, sei lá. E fiquei imaginando o que ofereciam essas palavras em uma língua quase desconhecida aqui. Pode ser desde um pedido de desculpas, uma oferta de emprego, um anúncio de um crime. Lá, parece indecifrável, e é tão pequeno frente à cidade o cartaz, em dois ideogramas. Mínimo como os títulos do Graciliano.
Mas tenho vivido também a cidade das macro situações. Há uma onda de crimes no bairro que cresci. Crimes violentos, cheios de marcas de balas pelos muros do bairro. Junto, tenho visto o grande elefante do transporte levar e trazer milhares de pessoas. E as grandes confusões que se fazem em torno do futebol, do preço da cerveja, dos impostos e das imposições.
Fui ao Maletta mais de uma vez. Tenho ido lá, passado por lá. Lembrei de tanta coisa! Lembrei de nossa última vez lá, nossos ires e vires. Nosso eterno re-ocupar-de mudança, sossego, paz e desarranjo. Lembrei-me de a gente falando besteira também e deu saudade. Há tanto nessa vida a se ver, no micro e no macro espaço, aquilo tudo muito cheio de água e de fumaça, muito cheio de verdade, seja ela qual seja, eu que ainda não sei o que isso significa.
O movimento. A minha questão agora é movimento. É um ser de tentáculos. O trânsito diuturno do tempo. Pequeno, como o espaço do dia, imenso como a viagem estelar da via láctea rumo ao seu previsto choque com Andrômeda (e aí está um espetáculo divino que queria ver, o amor destruidor de duas galáxias em choque, criando outra). E será que desse encontro, em quantos bilhões de anos, vida inteligente surgirá, dessa vez relegada a uma espécie melhor que a nossa?
Há saudades. Sempre. E há café à sua espera.