sexta-feira, 19 de outubro de 2018

Ele Não, Ele NUNCA


O Desde que o samba é samba vem, desde as eleições de 2010, comentando os trâmites eleitorais. Ficamos mais em silêncio nessa eleição por muitas razões. Em especial, por uma necessidade de entender uma série de acontecimentos dos últimos tempos. O central, a nosso ver, é o que se desdobra das manifestações de 2013. Estamos ainda sofrendo as consequências dela e, acredito, a mais violenta é o desmanche da educação proposto pela EC 95 e pela reforma do ensino básico.
Digo isso porque acredito que as manifestações de 2013 não foram por causa do preço das passagens, mas pela construção, via educação, de uma geração consciente de sua força política e de seu papel como agente no espaço público. Podemos notar isso de muitas maneiras diferentes. Desde que houve substancial aumento do ingresso do jovem na educação superior pelas políticas de ampliação das universidades e de facilitação do acesso ao ensino privado via Prouni e melhor estruturação do FIES, assim como o acesso ao ensino federal de nível médio com a ampliação dos Institutos Federais, muitas manifestações políticas aconteceram. E as manifestações políticas não necessariamente são pensadas na lógica partidária, mas na construção gradual da consciência de cidadania. A ocupação das cidades e a nova ideia de reconhecimento no espaço público como se deu nas capitais do Brasil, o renascimento de carnavais urbanos por todo o país, a construção de uma identidade estudantil que garantiu, mesmo sob forte ataque, a ocupação das escolas secundaristas e a reinvenção do jovem de seu lugar de fala são amostras disso.
Todas as mudanças políticas – e não partidárias – fizeram a juventude brasileira entender que é por meio da luta que conquistas são alcançadas. Por meio de ocupações e embates que a democracia se faz. Entenderam que era preciso ocupar o espaço do debate público e livre de ideias. E o debate de ideias questionou as profundas desigualdades que ainda não resolvemos no campo dos costumes. O debate de ideias deflagrou nosso racismo, nosso machismo, nossa homofobia. A educação colocou em cena as mazelas nacionais sem posicionar nenhum fuzil contra ninguém. A necessidade de construir um lugar identitário sólido de reconhecimento social e político aqueceu o debate da última década, debate construído depois de uma década e meia de forte investimento em educação. Foi a educação que propiciou isso nos últimos anos.
E claro, o debate provoca o pensamento. E boa parte da população brasileira não está preparada para o debate. Lembremos que gerações foram formadas para obedecer, educadas na ditadura militar, sob forte censura nos livros e nos métodos didáticos. Muitas pessoas do Brasil não sabem debater porque os governos ditatoriais do século XX alienou-as de seus lugares políticos, formou-as para obedecer patrões e governos e se calar, sob a imposição do medo e da punição.
Acho que é aí que nasce o ódio de gerações que, vítimas de baixos investimentos em educação, condenam os professores. Porque, claro, o jovem, na cabeça dessa geração vitimada, não é capaz de pensar por si só. Ele só ocupa as ruas, só reivindica direitos, só toma consciência política de classe e de identidade se for doutrinado por alguém. Para a geração educada no século XX, sob o medo e a repressão, um jovem não pode querer ser o que quiser. Porque essa geração não pôde ser o que quis. E acha que todos devem, como ela, amargurar não poder escolher.
A ampliação e a gana fascista que tomou conta do cenário político nos últimos anos é resultado do ódio ao investimento sólido em educação. Porque foi nos governos petistas que a educação chegou a muito mais pessoas do que antes, de forma muito menos dogmática e muito mais democrática que nos anos de chumbo ou nos anos de transição do século. As primeiras décadas do século XXI mostraram ao jovem brasileiro que a educação gratuita e pública pode sim levá-los a outros lugares, a outras conquistas, a aceitação de si mesmo sem tantas obediências a normas vazias de conduta. Por isso a marcha fascista é, sobretudo, contra a educação.
A lógica fascista quer censurar a escola que criou transformações. Por isso as mentiras das mais variadas maneiras, como o “kit gay”. Porque o fascista ama a obediência cega, sem o debate. Porque o fascista não sabe conquistar o respeito das pessoas a não ser pelo medo, pelo autoritarismo, pelo silêncio, pela ameaça e pela força. Porque ele não se garante no debate. Ele não tem argumentos contra o desejo de liberdade e de mudança que tomou conta de boa parte da juventude brasileira, eclodindo nas manifestações de 2013. Por isso os golpes políticos, a violência gratuita.
Vivemos o período mais sombrio do início deste século. Um século que nasceu com promessas de prosperidade, mas que se volta para o início do século passado, no ressurgimento fascista descabido. Estamos às portas de mergulhar outra vez nos anos de chumbo onde qualquer expressão gerava cadeia e morte. E os professores, os intelectuais e os jovens que se opõem serão os primeiros a morrer. Por isso, enquanto ainda houver possibilidade de debate, que aqueles que acreditam que a educação é o único caminho transformador, que não elejam Bolsonaro. Há nele o que há de pior no Ocidente. E ele nos levará a todos ao mais profundo caos que já enfrentamos. Porque nunca vivemos sob a ameaça real do fascismo. E o fascismo matou milhares de pessoas no mundo todo.

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