sexta-feira, 18 de julho de 2014

Do retornar


Numa praia de Vila Velha, esta semana, um filhote de baleia jubarte encalhou e morreu. O filhote pesava mais de uma tonelada e já apresentava as marcas das mandíbulas que tanto aprecio nas jubartes. Há muito, quando ainda morava na Ilha, no pequeno apartamento que recebeu esse nome em Vila Velha, falei com Luana que as baleias escolheram o mar, a sua liberdade e o que ele tem de ilimitado, o que fazia delas, para mim, os melhores animais dentre os seres vivos.
Quando uma baleia encalha, muitas coisas me passam em mente. A mais marcante é a razão pela qual vêm à praia, elas que desistiram da terra há milhares de anos. Por mais que os especialistas falem as muitas razões que trazem baleias às praias, algo nisso me impressiona, porque não é, para mim, um fenômeno de todo desligado do sentimento ancestral de voltar.
É teoria da ciência moderna que as baleias já foram, em algum momento da evolução, mamíferos terrestres que se alimentavam de pequenos crustáceos nas praias de um mundo anterior à humanidade. Por uma necessidade de adaptação, por cada vez mais entrarem no mar para buscar alimentos, as baleias evoluíram e, então, entraram definitivamente nas águas, deixando para trás o mundo terrestre e sua forte gravidade. Mas não perderam, nesse processo de evolução, seu amor ao ar que respiram.
Visto que a vida no planeta saiu do mar, a volta desse mamífero às águas é, a meu ver, como disse, um tipo particular de grito de liberdade. É uma escolha que mudou uma série de estruturas de biomas complexos, alterou a vida no planeta. Os maiores mamíferos do globo, ao voltarem ao mar, por sobrevivência, retornaram ao lugar do princípio e lá evoluíram, livres do peso do mundo.
Então, por que voltar à praia? Por que só algumas baleias encalham, só algumas são enterradas nas areias ancestrais que seus antepassados pisaram?
Penso sempre que vejo isso: as baleias sentem, de alguma maneira, saudades da praia. Mas algumas, só algumas, retornam, mesmo essa de que falo, a jubarte ainda filhote. E a saudade pode ser desastrosa nesses casos, porque sair do mar não fará as baleias voltarem a andar. E voltar, essa pulsão natural, pode ser a mais fatal das escolhas, causando-nos, por fim, a sensação de que tudo, enfim, pode encalhar. E se encalhar, morreremos, ou poderemos contar com as marés?

Um comentário:

  1. Sempre retornamos, de alguma maneira, para o lugar de onde viemos ou o qual nos sentimos em casa. Onde é sua casa?

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