as madrugadas de domingo, as tardes de quarta, maio, a segunda quinzena de novembro, o dia de pagar o aluguel, a hora do almoço, a viagem na família, o embreaga-te, a mesa laranja, a máquina de escrever, o canto da coruja, joão gilberto, a valsa vazia, a ante-sala madrugada, a janela sob a cômoda, as pombas no meio-fio, os restos de carnaval, o liso do sussuarão, o habitar, as declinações do grego antigo, os sinais vocálicos do hebraico, o tempo verbal, o giz, o grito de gol, um beijo no guardanapo, um bolero ruim, um texto ruim, o passar deste rio.
segunda-feira, 16 de setembro de 2013
quarta-feira, 4 de setembro de 2013
Pelo mês do aniversário do Poeta Maior
Estamos a praticamente meio mês das comemorações do aniversário de Drummond. Este ano, se estivesse vivo, o poeta comemoraria 108 anos de vida em dia de eleição. E neste ano, ele não aparece, escondido que está, dentro de seus livros.
O mais engraçado é que a popularidade de Drummond vem assomada de uma série de coisas. O poeta é mais uma marca do que reconhecido pelos seus textos. Tem estátua no Rio, estátua em Itabira, Fundação cultural, selo comemorativo, moeda especial da casa da moeda, bóton, camisa, chaveiro, bibelot de estante, xícara, quebra-cabeça, viaduto, bilhete de ficha de cerveja de festa de DA de letras: Carlos Drummond de Andrade virou coisa.
As coisas Drummond, pelo país, são rios de lucros para comerciantes que o exploram como a uma mina de ferro, de ouro, vendendo-o a um conjunto de fãs que colecionam - como eu - cada uma dessas quinquilharias. Falta ser marca de perfume e rótulo de conhaque.
Logo ele, que inveja a força das coisas. "E eu não sou as coisas e me revolto", verso de Nosso tempo. Logo ele, tão preocupado com o não tornar-se etiqueta, que tanto pediu pela paz dos picos de Itabira, quando ainda existia pico em Itabira.
A coisificação da figura do poeta é um fenômeno ainda não pensado e de difícil digestão. Como coisa, Drummond vira marca, produto, tem preço estampado. Drummond já foi moeda corrente de rápida desvalorização no plano Cruzado.
Nisso, claro, há o reconhecimento do amor que o povo tem por seu poeta. Se não fosse amado, não seria tão lembrado. Mas o problema é que em tudo que se vê gosto também se vê dinheiro e o que ele é capaz de fazer com a imagem do poeta: vendê-lo, só por ser ele, por qualquer meia dúzia de reais.
Isso me incomoda um pouco. Drummond deveria ser lido, ser estudado, estar na vida das pessoas por seus textos. Não porque se tornou coisa, como monumento público ou xícara de café. Deveria estar por ser literatura, não pela sua figura pessoal. Transformar Drummond em coisa é esquecer, em parte, o que Drummond dizia, na ilusão de que a comercialização de sua imagem o mantém vivo.
Deveria estar na boca do povo e não no bolso das políticas públicas oportunistas, como a secretaria de turismo de Itabira tanto explora, e a de obras de BH tanto faz questão de edificar. Os escritores brasileiros deveriam ser patrimônios não por serem pessoas geniais, figuras de outdoor, e sim porque escreveram coisas geniais, que não se estampam nos mesmos outdoors.
Não acredito que a coisificação do poeta propicia uma maior leitura de seus textos. É fenômeno que merece ser pensado. Fato é que Drummond agora é produto mercantil do mundo caduco que criticou.
Mas, independente de ter virado coisa, Drummond merece os parabéns, talvez um dia, um feriado. Parabéns, poeta!
segunda-feira, 2 de setembro de 2013
Ouro Preto, um mimo
Quando não mais se tem saídas e quando o caminho parece um eterno círculo com muros e pedras, surge Ouro Preto, ao sol do fim de inverno, vestida para a festa cheia de mimos. Com tecidos, rendas, anéis de vários lugares do país e do mundo, com sorrisos de dançantes na praça às três da madrugada, a cidade fez sair – como é bem de seu feitio – arte de todas as paredes centenárias. E arte é como café com pão, arroz com feijão. Deve alimentar a vida todo dia, seja no livro que carrego comigo, nas músicas que ouço em casa, na arquitetura secular preenchida com suas pesadas sombras. Ouro Preto alimenta pelo simples fato de estar lá, exposta ao mundo em suas ladeiras, trombando com os idiomas todos, suas misturas e seus encontros cheios de novas experiências, de conversas de madrugadas inteiras sobre aquilo que sustenta os túneis subterrâneos da cidade.
Foi no silêncio do sono das ruas do Antônio Dias que o círculo, enfim, se desfez. A possibilidade de mais, fome insaciável desta última busca, está lá, enaltecida e resguardada, à espera de quem a descubra como quem lhe arrancou ouro. Nas dobradiças das janelas, nas placas em frente às casas, nas padarias, nos becos, em seus museus e templos, seus fantasmas e histórias. Encontrei a rachadura no muro do caminho e lembrei o que buscava no início da empreitada: saciar a vontade de mais, de alguma forma, com muita arte.
Só a arte refaz as pessoas, cria as possibilidades de mundo passíveis de habitação, de contato, esta imensa praça de convites. Achei a praça da arte e enquanto ouvia uma banda da Jordânia (que passa por período tão complicado), comentando sobre o perdido show do Madredeus com uma mulher muito mais fã do que eu, (conversa que desdobra, buscando a Lisboa aspirada, o fado de Mariza, de Cristina Branco, de Dulce Pontes), entre uma e outra observação do arranjo das músicas orientais, cheguei, depois, com passos mudos na madrugada vazia no bairro de Aleijadinho, ao ponto em que o muro se desfaz em pó: a escolha de tudo começa, sempre em mim, por onde aponta o norte onde a arte é guia.
Foi no silêncio do sono das ruas do Antônio Dias que o círculo, enfim, se desfez. A possibilidade de mais, fome insaciável desta última busca, está lá, enaltecida e resguardada, à espera de quem a descubra como quem lhe arrancou ouro. Nas dobradiças das janelas, nas placas em frente às casas, nas padarias, nos becos, em seus museus e templos, seus fantasmas e histórias. Encontrei a rachadura no muro do caminho e lembrei o que buscava no início da empreitada: saciar a vontade de mais, de alguma forma, com muita arte.
Só a arte refaz as pessoas, cria as possibilidades de mundo passíveis de habitação, de contato, esta imensa praça de convites. Achei a praça da arte e enquanto ouvia uma banda da Jordânia (que passa por período tão complicado), comentando sobre o perdido show do Madredeus com uma mulher muito mais fã do que eu, (conversa que desdobra, buscando a Lisboa aspirada, o fado de Mariza, de Cristina Branco, de Dulce Pontes), entre uma e outra observação do arranjo das músicas orientais, cheguei, depois, com passos mudos na madrugada vazia no bairro de Aleijadinho, ao ponto em que o muro se desfaz em pó: a escolha de tudo começa, sempre em mim, por onde aponta o norte onde a arte é guia.
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