quinta-feira, 14 de abril de 2016

Luta




Escrevi o poema acima no meio da graduação. Ele foi escrito muitas vezes, em apostilas, textos, etc. Hoje o reencontrei, ainda à mão. O poema esperou o dia de hoje para ganhar as cores. Esperou o dia de hoje para chegar neste formato. Ficou guardado numa cópia de um livro de um autor russo esperando o momento do salto.

Na época que o escrevi estava envolvido com o movimento estudantil. Se não me falha a memória, foi um poema escrito quando apoiava e fazia campanha para uma chapa de DCE encabeçada por amigos dos cursos do ICHS-UFOP, chapa que ganhou uma quente eleição e que levava a palavra luta em seu nome. No calor daquela eleição só pensava nos sete degraus da luta por que passávamos. Naquele momento, a luta era feroz - por votos, por discussões, por lugares de debates, por mudanças das posturas da universidade diante de questões que até hoje aquecem os debates dos alunos da UFOP - moradia, amparo estudantil, segurança, melhores condições de ensino e permanência. Uma luta diária em meio a  um corpo discente dividido naquela disputa de duas chapas com aspirações opostas e com diálogos calorosos. Em mim o eco era esse, como está aí no poema. 

Hoje é outro tempo e a luta para que eleições ainda possam trazer esse calor. Para que a democracia siga, cada vez mais madura, propiciando a construção daquilo que fazemos aos poucos, na constante luta política que nos move. Hoje, meu poema diz mais do que eu queria dizer naquela época. E dentre as muitas coisas que diz, diz que o ato de lutar é sempre múltiplo e este poema, o poema, a escrita, é meu lugar de luta. Escrever também é lutar, "lutar com palavras", citando Drummond. E quando o ciclo do dia se consumir, a luta prosseguirá nas ruas do sono, na noite, esperando o raiar de outro dia.  

domingo, 3 de abril de 2016

pensar o dia, a hora, e não ser. pensar o que traz o mar, o que tem na concha, o que existe de distância no vento que percorre o rio. pensar no rio, seus peixes de nomes conhecidos e desconnhecidos, seus mistérios, em Iara no fundo comendo os precipícios. pensar no que existe além da canoa, na terceira margem que liga o aqui e o não aqui, parada no grande seguir das águas. pensar no calor sob um céu azul que nem cabe tanto azul e sentir saudades das espumas das ondas, do penedo, das noites frente ao cais desabitado com seus barcos e pescas para depois.

talvez olhar o mar mais uma vez de olhos apertados e chorar. talvez lembrar que há água em mim por inteiro e que volto para perto dela, seus amanheceres. talvez olhar o rio largo sob a ponte, as croas e os manuelzinhos, os pássaros de muitos nomes, as docas e as dornas, um vocabulário novo e espinhento como um pequi por dentro. talvez encher a língua de espinhos quase invisíveis para lamber o outro. lambida espinhenta que traduza esse vário sentir, para arranhar e ferir como fazem as galhas ao fundo das chalanas.