A pegada na areia, feita à mão, recria o pé e recria o tempo, tece linhas azuis invisíveis. Tece o que sobra de areia no ar quando venta na praia vazia, no mar inabitado. O vazio cabe inteiro dentro de um quarto, dentro do fá sustenido, de um ponto de exclamação. O vazio cabe dentro do som, quando o som, só onda, também é azul e invisivelmente inabitado. O inóspito hábito de tudo, quando não cabe mais nada no tempo de coisas e apetrechos, seus suores de depois. E a solidão, por fim, imensa, rompe o vazio. Aquela que a mão ao criar a pegada na areia quis eliminar. Aquela que os fios azuis quiseram disfarçar, sem entender que o que há, sempre, é solidão, como na onda, no mar inabitavelmente azul. Porque quando a mão criou, creditou, fiou, não havia a espera seca de outro ser, em vão. E as linhas azuis e o mar inabitado sepultaram, por fim, o fio tecido; engavetou-se o fiandeiro em si mesmo na ilusão que teceu pelo caminho, na ilusão que sobra na areia, quando se percebe que não houve pé a pisar a areia: a marca era à mão, criada por ela e por ela duvidada, quando pronta, jurando ser um pé de alguém ainda a pisar a marca que só à mão satisfazia. E a mão a custo acredita saber que a criação escondeu o que há de inaceitável: que há areia, e que ela, sim, seca, é real e inalcançável. Não é companhia e nem cabe nela o lá bemol, o si uma oitava acima.